sexta-feira, agosto 14, 2009

Neuroses que podem ser curadas

Por NandoMax

O meu interesse em fazer jornalismo nasceu da constatação do óbvio: só me restou esse caminho. Sem grandes expectativas e sem nenhuma conversão. Ouvi, certa vez, que todos os jornalistas teriam que passar, necessariamente, por uma espécie de chamado especial. Tal e qual a aqueles avistados nas religiões triunfalistas. De certo modo, passei a entender os motivos que fazem do jornalista um ser extraordinário. Encontrei alguns jornalistas que fizeram com que qualquer outra coisa se tornasse desinteressante enquanto este estivesse falando. Isso deve ser bom. Deve significar algo. Mas nenhuma referência, até agora. Sou uma pessoa comum que possui um desejo incomum de conhecer sobre tudo. Para o bem da verdade gostaria mesmo era de ter vivido quatro vidas antes de dizer: “agora é pra valer”. Tentei ser jogador de futebol, mas notei que não tinha tanto vigor - e o principal, conclui que não gostava desse esporte. Tentei ser barman, mas não obtive êxito em ser um eterno personagem “global”. Viajei para o mundo das exatas e caí de para-quedas no nada atrativo universo da Engenharia de Produção. Fui do éter à práxis. Da Filosofia ao Turismo. Busquei-me em todos os lugares, mas me encontrei quando havia desistido de mim mesmo. Achei-me cativo num lugar-comum observando a escuridão e, desta feita, me abastecendo dela.

“Quem combate monstruosidades deve cuidar para que não se torne um monstro. E se você olhar longamente para um abismo, o abismo também olha para dentro de você.”

Friedrich Nietzsche - Além do Bem e do Mal


Questionei a minha existência e encontrei alguns amigos especiais. Amigos que me passaram um pouco de suas frustrações, descobertas, anseios e o principal, pude compartilhar com eles uma intimidade que não havia encontrado em lugar algum. Amigos que passaram a ser mestres em minha vida. Dois eu chamei – e ainda chamo – de messias. O primeiro eu posso apresentar, mas o segundo vou deixar para o final. Como não poderia deixar de ser, para um messias, o Bigodudo¹ me fez mais do que trazer esperança, ele me mostrou a vida. Ensinou-me que os grandes podem até ser imortais, mas não infalíveis como querem alguns poucos que estão lá acima, no alto do seu pedestal. Com quem mais eu poderia compartilhar os meus pensamentos hereges? Não havia ninguém mais. Em um grupo restrito de pensadores contemporâneos, mas que morreram há algumas décadas, eu encontrei uma interação necessária.

Em meio às descobertas, resolvi que deveria buscar conhecimento sobre o divino antes de tentar me conhecer. Para tal, matriculei em um curso Bacharel em Teologia. Nesse meio-tempo, fui pastor de jovens em um segmento cristão-pentecostal durante um ano e meio. Havia descoberto minha vocação. Definitivamente eu estava no mundo para evangelizar. Nada mais. Fui missionário enviado ao Vale do Jequitionha e lá fiquei por oito meses. Não consegui me manter naquela região por mais tempo porque decidiram que já era hora de eu voltar. Afinal, a minha preocupação com o lado humano havia ficado maior do que a preocupação com o lado espiritual e isso incomodou alguns engravatados. Um prato de comida valia menos do que um “Desencapetamento Total”. Um abraço era bem menos importante do que as - vãs - orações ofertadas no quente chão do nordeste mineiro. Acabei voltando para casa com um vazio ainda maior do que antes.

Quando retornei à Beagá, não era mais aquele cara que havia saído cheio de esperanças. Em nada lembrava aquele rapaz que encontrou respostas para tudo em apenas quatro letras: D-E-U-S. Este ser divino representava a morte de qualquer pergunta mais elaborada. Mas não agora. Voltei ao início e desta vez com uma sensação de fim de jogo.

“Não pretendo ser feliz, pretendo ser verdadeiro”

Friedrich Nietzsche


Por conta das minhas dúvidas, cheguei ao ponto de negar a Fé como certeza incontestável. Dizer que todas as transições foram encaradas com naturalidade é bazofiar uma grande mentira. Afirmar que a mansidão esteve presente em todos os momentos é desmerecer o desespero que volta e meia tomava conta de meus pensamentos confusos. Não precisa nem dizer que sou uma pessoa agitada. Nem preciso justificar os meus muitos copos de cafés que tomo ao longo do dia. Parece que estou correndo atrás de um tempo perdido. Um tempo que nunca tive, mas que me parece real. Antes mesmo de falar das habilidades, seria mais justo continuar listando algumas deficiências: sou estressado, tenho DDA/TDAH², ajo com ingênuidade para muitas coisas, indeciso, curioso e apaixonado. Muitas outras deficiências ficarão subentendidas quando se compreende o que é TDAH. Apesar de ser relevante, deixarei este assunto para que possa ser pesquisado, valerá a pena.

Apesar de tudo, a humanidade me fascina. O ato de ser demasiadamente humano e obter gozo em reconhecer meus limites, bem como minhas superações, me traz aquela boa sensação de estar vivendo. Gosto de me sentir útil quando todos já desistiram. Vou além do que está escrito e nunca me contento com o básico – não é propaganda falsa. Chego a perder o interesse quando não me sinto desafiado e/ou fascinado. E isso aconteceu muito. Isso irá acontecer muito. Estou no meio acadêmico desde o ano 2000. Não terminei nenhuma graduação, mas me especializei em todas. Uma mescla entre autodidatismo com decepção. Tudo isso teve o seu lado bom, pois, aprendi que a decepção é proporcional à expectativa. Hoje, apenas vivo. Sou humano e consigo reconhecer a humanidade em todos. Sendo bastante direto, deixo uma lista de algumas habilidades minhas: DDA/TDAH, ingênuo para muitas coisas, companheiro, verdadeiro, curioso e apaixonado. Algumas deficiências se tornam habilidades em certos momentos e vice-versa.

“O homem pode se livrar de uma neurose, mas não pode curar-se de si mesmo”

Jean Paul Sartre

Antes que me esqueça, aprendi sobre neuroses que podem ser curadas com meu outro messias, Jean Paul Sartre. O ruim é ter chegado à conclusão de que somos quem podemos ser. Disto, nem os mais hábeis poderão escapar. A dor (ou o prazer) de ter que conviver consigo mesmo é algo imutável. É algo divino!

Prevendo que este Memorial fique ainda mais extenso, tentarei ser mais direto daqui para frente – posto que até agora me senti livre para seguir qualquer caminho.

Tracei um objetivo profissional que está aberto às futuras mudanças. Estipulei, sem qualquer expectativa, que deveria ter uma base. Essa base seria o Jornalismo. Com o título de bacharel, irei prestar concurso na área da comunicação. Nesse meio-tempo iria propor uma tese para ser defendida ao nível de stricto sensu (Mestrado/Doutorado). Após estar devidamente titulado, encerraria minha vida acadêmica ofertando, assim, todo o meu conhecimento à geração porvir.

Espero não ter sido prolixo demais. Acredito ter acertado na escolha do Jornalismo como objeto a ser estudado. Isso só o tempo dirá. Até lá, deixarei de ser Jornalista para ser um satisfeito saudosista. Não desejando ter feito milhões de outras coisas, mas pelo fato de ter sido um grande íntimo da comunicação. Alguém que, assim como Fernando Pessoa, soube dizer com alegria: "Pedras no caminho? Guardo todas, um dia vou construir um castelo”. O castelo será construído. Quando, onde e por quem, não sei.

“Não importa o que fizeram com você, e sim, o que você fez com aquilo que fizeram com você”

Jean Paul Sartre




¹ Apelido aferido à Friedrich Nietzsche por conta do seu volumoso bigode.

² TDAH - Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade ou DDA - Distúrbio de Déficit de Atenção (com ou sem hiperativade). Vídeo explicativo no Youtube. Pesquisar: “Jo Soares TDAH(DDA) - Ana Beatriz Silva”.

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